
Primeiro, os animais foram mostrados sem uma sequência evolutiva, daí ora estava uma ave, ora era um molusco, ora um mamífero. Isso resultou em um senso de fortuidade, que aquelas inteligências na verdade eram algo pitoresco, por vezes engraçado e nada havia em conexão umas com as outras, menos ainda com a nossa.
No post anterior foi difícil para mim percorrer milhões de anos de evolução. Descrever o surgimento de células especiais (neurônios) fundamentais para a formação do sistema nervoso. Isso não seria possível sem uma certa graduação que se iniciou com os primeiros seres vivos até as formas mais complexas.
O raciocínio é o mesmo e dando continuidade à evolução do ponto onde paramos, em um oceano repleto com metazoários, uns predando os outros (sem contar as demais formas de interação) e em meio a uma crescente espiral evolutiva rumo ao aumento de complexidade dessas relações, o sistema nervoso se tornou cada vez mais complexo... De ancestrais vermiformes deuterostomados nós vertebrados emergimos para a existência.
O nosso cérebro seguiu o desenvolvimento dos órgãos sensoriais concentrados na cabeça. Visão, audição, olfato, paladar, tato e eletromagnetismo, todos os seis sentidos estão presentes na cabeça dos primeiros peixes. Importante ainda ressaltar a nossa natureza de simetria bilateral. Desde as primeiras formas de vida predadoras como os vermes marinhos platelmintos e nemertinos que somos assim, um lado de nós é a imagem do outro lado refletida no espelho. Todo o nosso corpo é assim, lateralizado!
Em um mar repleto de predadores é importante demais olhar aos lados. Não apenas olhar (até porque a visão não é assim tão eficaz abaixo d’água) e sim ter todos os sentidos em constante alerta para possíveis ataques, ou mesmo para atacar uma presa.
O capricho do evento estocástico da lateralização de nossos corpos é que ela não é perfeita. Ao invés de cada lado processar diretamente os sinais do ambiente, eles são cruzados ao inverso. Todo o seu lado esquerdo é comandado pela parte direita do seu cérebro, o inverso para seu lado direito. Também não é exclusividade nossa, em todos os vertebrados há sempre um lado “preferido” para a ação. Adivinhem?! A maioria dos vertebrados é destra! Claro, e sempre existe também um canhoto entre nós!
Uma hipótese para esse circuito cruzado é fazer com que o organismo como um todo possa ter a possibilidade de interpretar e reagir a estímulos. Por exemplo, um ataque pela esquerda ao cruzar as conexões até a parte direita informa todo o corpo do animal e não apenas o lado atacado.
Por ordem de chegada e em termos didáticos temos (ver Sagan, C., 1997. Os dragões do Eden. Editora Gradiva):
(1) Medula espinhal, rombencéfalo [o bulbo, a ponte e o cerebelo] e mesencéfalo.

(2) Sistema límbico formado por amigdala, tálamo, hipotálamo, hipocampo e áreas específicas (giro cingulado, área tegumentar ventral, área pré-frontal).
(3) Neocórtex (lobos frontal, parietal, temporal e occipital), o qual envolve o restante do cérebro nos mamíferos.
Agora vamos dar reconhecimento ao primeiro trabalho científico que vislumbrou que nossas emoções humanas na verdade evoluíram a partir de ancestrais não humanos. Charles Darwin em seu clássico “A expressão das emoções no homem e nos animais” (1872; lançado no Brasil pela Companhia das Letras em 2000) foi o primeiro a demonstrar, com base em observações científicas (hoje chamamos essa área do conhecimento biológico de Etologia), que compartilhamos com outros vertebrados sofrimentos, lágrimas, ódio, raiva, alegria, bom humor, amor, devoção, surpresa, horror, vergonha e modéstia. Os dois extremos as lágrimas e o sorriso, já pensamos que eram exclusividades humanas. Hoje sabemos que elefantes choram e chimpanzés riem e muito!
Como bem sabemos, nós possuímos em comum as mesmas “borboletas da alma” (neurônios) e, entre os vertebrados, compartilhamos o mesmo “chassi neural” (Medula espinhal, rombencéfalo, mesencéfalo, sistema límbico e neocórtex). O que nos faz amar e sermos inteligentes, também está presente na anatomia e fisiologia animal, antes mesmo de sermos o que somos.
Claro, essas palavras escritas aqui, em um ambiente digital de plástico e sílica e transmitidas por cabos de fibra óptica, deixa-nos a sensação de sermos muito diferentes. Além do mais, olhem para nosso prato de comida repleto de cadáveres de animais e plantas. Se reificamos (de reificar, transformar seres em “coisas”) tudo e usamos de nossa fantasia de não sermos deste mundo, os filhos dos deuses, fica fácil de escravizar, matar, cortar em pedaços e comer outros seres vivos.
Em termos de cognição o próximo post será apenas sobre humanos, como muito bem gostamos de fazer, uma atenção especial na origem da consciência, a mente, do que é formado nosso pensamento e os sonhos de ficção científica que agora começam a se realizar, podemos transmitir pensamentos fora do corpo e, quem sabe, em futuro próximo, armazenar registros eternos de pensamentos humanos em máquinas.
Esse será o dia da transcendência para algo diferente da natureza. Será o dia da Inteligência Artificial e das Histórias de Robôs editadas por Isaac Asimov se tornarem realidades. Até lá, continuamos o que somos, mamíferos emocionais, macacos neuróticos e meros trabalhadores explorados.
A importância dos seres humanos hoje reside na ligação deles com a biota. Então, olhe dos lados, leia um pouco e faça a conexão, perceba um mundo cheio de sentimentos. Você não está sozinho, há outras inteligências na natureza.
Referências
Darwin, CR., [1872] 2000. A expressão das emoções no homem e nos animais. Companhia das Letras.
Masson, JM. e McCarthy, S., 1998. Quando os elefantes choram: a vida emocional dos animais. Geração Editorial.
Pepperberg, IM., 2009. Alex e eu: como a relação de amor entre uma cientista e um papagaio revelou os segredos da inteligência animal. Editora Record.
Sagan, C., 1997. Os dragões do eden. Editora Gradiva.
Thomas, K., 1988. O homem e o mundo natural. Companhia das Letras.
Links
Inteligência dos Elefantes
Inteligência dos Animais
Inteligência Animal Superinteressante
Inteligência Animal Wikipédia
Inteligência nos Animais
Animais têm Emoções
Emoções nos Animais