
Um dos momentos mais marcantes de minha vida foi a noite em que fui até a Praia de Lucena - PB ao lado de meus dois grandes amigos, Alexandre (professor da UFRN) e Eduardo (professor da UFPB). Bebemos muito e depois fomos tomar banho de mar. Lembro das águas-vivas luminescentes na água, a beleza e o perigo tão pertos.
Depois deitamos na areia da praia e ficamos olhando as estrelas... Nunca havia visto tantas e tantas. Eduardo estava na graduação de Física e começou a falar muito sobre a Via Láctea, as constelações e o universo. Olhei o céu em profundidade, não como um papel escuro e luminoso do teto de nossa casa... Olhei em profundidade como o mar, imaginei as águas-vivas que acabara de ver passeando pelo espaço. Imaginei eu mesmo mergulhando naquele céu profundo.
Era tanto espaço, tanto... que me faltou fôlego. Senti-me rapidamente sem ar, em uma agonia por ser tão minúsculo, tão insignificante por ter tanto lugar para estar, tanto espaço, uma vida tão breve e uma imensidão de beleza tal que nunca irei ver... que simplesmente não possuia mais ar para tomar.
Eu sei que o universo "É", mas não sei como ele é e por que ele é. Nenhuma descrição da Física possui sentido satisfatório para essas perguntas feitas em uma mente primata do Pleistoceno. Meu maior amargor em vida é saber que não poderei ver mais do universo do que as imagens incríveis do Hubble. Há nebulosas, galáxias e estrelas de beleza impossíveis da imaginação humana. Sem contar a matéria escura, o que é essa escuridão?
Meu desafeto com a morte é justamente a perda de tempo para tentar ir mais longe no universo. Nem que seja pela leitura de artigos, livros e imagens.
Pergunto porque cada pessoa não se questiona o que é isso acima de nossas cabeças. Como se pode viver alheio a esse leviatã?
Nosso Sol sucumbirá e arrasará nosso sistema solar em termos de vida. Talvez antes dele se transformar em uma supernova, suas tempestades causem mudanças profundas no clima da Terra... estamos "lascados". Aquecimento global, um buraco na camada de ozônio... A estrela que nos provê de energia para viver, poderá nos matar.
Uma das canções mas tocantes sobre esse assunto é "Omega" de Bruce Dickinson:
Difícil de descrever a sensação de agonia que sinto desde aquela noite em Lucena. Enquanto os tolos de minha espécie passam boa parte de seu tempo matando uns aos outros por causa de crenças folclóricas... Planetas com dez vezes o tamanho de nossa Terra estão bem acima de suas cabeças. Há matéria de verdade, real e física, problemas de verdade para enfrentarmos pela sobrevivência do ser humano.
Devemos cuidar de nossa casa, óbvio. A Terra é nosso berço, será também o nosso túmulo. Temos que prolongar o máximo de sustentabilidade da vida (isso inclui todas as formas de vida, caro leitor) para termos tempo de tentar sair da Terra antes que ela deixe de existir. Como tudo que é feito de matéria, ela irá cessar de existir, transformar-se-á em poeira das estrelas, do jeito que foi formada... será o seu retorno no fim. O eterno retorno da matéria.
Interessante sobre isso é a hipótese Gaia de James Lovelock que descreve a Terra como um super-organismo vivo. Onde todas as formas de vida estão em uma certa simbiose para a homeostase planetária.
Alguns usam de antropomorfismo para relatar coisas como: o efeito estufa é a febre da Terra doente dos humanos.
O mais interessante é a dedução lógica de que se a Terra é um super-organismo, se ela está viva, então se reproduzirá. Como? Produzindo através de seu corpo de biodiversidade formas capazes disso. Aqui o ser humano é apontado como esporos reprodutivos. Explica o porquê temos essa ânsia de catalogar, entender e conservar toda a biodiversidade terrestre, assim como o desejo de sair deste planeta levando consigo sua história e genes (um GenBank de toda a nossa biodiversidade).
Por exemplo, se conseguirmos alcançar outro planeta habitável, certamente plantaremos bananas por lá para comer. Ou você acha que ficaremos contando histórias saudosas dos sabores que deixamos morrer na Terra? Nunca mais comer um belo churrasco de picanha? Nem pensar, levaremos não apenas o que nos é diretamente útil, mas o conhecimento para reproduzirmos nosso planeta.
Nós vamos querer nosso mundo azul novamente, vários deles por aí. Vamos reproduzir a Terra e cantar:
Se toda essa imaginação estiver certa, minha espécie surgiu para sair da Terra e reproduzi-la. Meus trabalhos científicos hoje estarão lá nos bancos de dados digitais, assim como as seqüências genéticas que descreveremos nos próximos anos.
Talvez isso explique minha ansiedade e falta de ar ao olhar para o universo nas noites claras, sem nuvens, sem lua cheia, apenas bilhões de estrelas... longe da cidade dos macacos.
Talvez isso também explique esse amor que temos pela biodiversidade, por todas as formas de vida deste planeta.
Se um dia eu fizesse um apelo nos jornais ele seria assim:
"Por favor, não destruamos a vida na Terra! Que nossa missão seja gloriosa pela matéria viva e não por um punhado de contos folclóricos sem ter nada vivo para ler em um futuro estéril."
Assim foi, eu, Alexandre e Eduardo, naquela noite estrelada, após nadar entre águas-vivas, deitados na areia conversando sobre o universo... ficção científica, ou sonhos do futuro para mentes jovens!