Escrever e falar de discriminação muitas vezes vêem com uma série de discursos prévios explicando isso e aquilo. As pessoas que abordam esse assunto, na maioria das vezes, não querem se identificar com os discriminados.
Homossexuais (homens e mulheres) são o exemplo clássico. O tema envolve vários aspectos, mas sobretudo envolve sexo e este sempre nos faz mais curiosos.
Outro aspecto importante é que falar de homossexuais inclui tabus sociais, como o sexo anal e oral, só de falar e escrever também deixam as pessoas rubras, ou mesmo até fazendo o sinal da cruz!
A identificação é algo assim: se você fala, ou escreve e não destrata homossexuais é porque gosta deles/delas. Se você gosta é porque também é um deles, se é um deles merece sofrer escárnio, se você não é de forma alguma um deles/delas, no mínimo é amigo, se é simpatizante... é um deles/delas... volta tudo para o escárnio.
Todos nós sabemos hoje que homossexuais são seres humanos e como tal sua sexualidade é definida geneticamente.
É um fato constatado tanto em humanos, quanto em vários outros animiais (macacos, leões, cavalos, ratos, hamsters, moscas, etc.). Apesar disso, há ainda muita discussão sobre essa informação científica.
Há aqueles que não aceitam a ciência, seja pela defesa, seja pelo ataque aos homossexuais.
Quem defende prefere os discursos do livre arbítrio e da tábula rasa, um homossexual é fruto do meio em que vive e escolheu sua opção sexual. Os que são contra, defendem esse mesmo ponto de vista, mas como vêem nessas pessoas algo de muito ruim, acham que essas escolhas sexuais são reversíveis, bastando assim convencer eles/elas a mudarem de vida.
Ambos estão absolutamente errados!
Heterossexuais não possuem esse nível de discussão e é ensinado desde cedo nas escolas o desenvolvimento embriológico e a base genética deles. Todos nós conhecemos as definições cromossômicas do sexo em nossa espécie XX para as fêmeas, XY para homens. Entretanto, esse não é um conhecimento total, porque não são os genes em questão, mas sim o cariótipo. Os genes que expressam a sexualidade estão nesses cromossomos, os genes de heterossexuais e homossexuais.
Já fizeram pesquisas das mais variadas formas e maneiras, não foi encontrada nenhuma evidência científica para os mitos populares que indicavam (1) a criação por um pai austero, (2) criação por pais separados, (3) criação apenas por mulheres, (4) modismo de adolescentes, (5) criação por pais liberais e (6) criação por pais adotivos. Ficou demonstrado que em todas essas situações os filhos podem ser ou heterossexuais, ou homossexuais, não havendo qualquer relação com a sexualidade em si.
E querem saber? Nós sabíamos muito bem disso, mas não queríamos admitir por preconceito e discriminação. Uma base genética para a sexualidade implica em genealogia. Ou seja, se sou heterossexual é porque venho de pais assim... Se sou homossexual?! Claro, não quer dizer necessariamente que essa correlação ocorra diretamente, mas que há na família de uma criança homossexual um parente assim.
Não gosto das comparações que li, ou como ouvi em sala de aula exemplos comparando a "problemas cardíacos", "hipertensão", coisas com base genética, mas que possuem conotações negativas... porque são doenças. A melhor comparação didática é assim: similar a cor dos olhos, a textura do cabelo, etc. É genético e faz parte da nossa espécie, são seres humanos como qualquer outro.
A história das perseguições é muito forte, está em movimentos estúpidos e violentos como a inquisição, os campos nazistas de extermínio e a eugenia. Muitos não gostam de falar sobre a biologia por trás da sexualidade, porque temem que algo como a eugenia volte acontecer. Se homossexualismo é genético, quem quiser eliminar todos, terá que matar famílias inteiras e não apenas os homossexuais em si.
Repetindo porque é para fixar: não temos o menor problema em aceitar os dados científicos a respeito da genética por trás da cor dos olhos, pouco ainda sobre como meninos e meninas heterossexuais são formados (sabemos detalhes desde a gametogênese até as descargas hormonais embrionárias e na adolescência). Temos várias séries de livros que são verdadeiros manuais passo-a-passo do desenvolvimento humano heterossexual (pe., Biddulph, 2002, 2003, Preuschoff, 2006). Entretanto, quando falamos de homossexuais há protestos e vozes nervosas em demasia.
Para entender melhor atenham-se agora a expressão da sexualidade. Há diferenças sexuais desde criança, meninos são mais agressivos e competitivos que as meninas. Estas são cooperativas, sentimentais e dominam melhor a linguagem (falada, escrita e expressa corporalmente). Ninguém ensina as crianças isso. Culparam a cor das roupas, o tratamento diferenciado dos pais para meninos e meninas, os brinquedos e as brincadeiras impostas. Novamente, após pesquisarmos, sabemos hoje que meninos e meninas são geneticamente assim. A educação (cultura) influencia sim em como essas pessoas irão se portar como cidadãos e quais conhecimentos terão a respeito da vida como um todo.
O problema é que nesse meio há homossexuais e eles são tratados como heterossexuais!!!
Não estou falando de igualdade em educação, compreenda, mas sim do olhar que define o ser humano com apenas dois sexos, onde há bem mais de três.
Não adianta criar um menino heterossexual como uma menina. Isso já foi feito, haverá seqüelas psicológicas, mas o menino continuará sendo heterossexual. É hoje fato científico (pe., Wright, 1996, Baker, 1997, Burnham e Phelan, 2002, Pease e Pease, 2000, 2003, Zimmer, 2003, Pinker, 2004, Winston, 2006).
Agora imagine ser homossexual e viver nesse mundo?! Espancamentos dos pais, espancamento dos "coleguinhas" na escola e escárnio social permanente. É assim que se narra a maioria das histórias dessas crianças.
Expressar a sexualidade genética é sim modulado pelo meio social. Nós sabemos disso, porque somos macacos, mas não somos chimpanzés, entenderam? Há diferenças culturais entre nós e nossos irmãos chimpanzés do gênero Pan.
Eu não posso, por exemplo, ter atração por uma mulher e simplesmente mostrar minha genitália excitada para ela em qualquer lugar, ou mesmo, quando sozinho com ela, a qualquer momento. Há normas sócio-culturais e até modismos de gerações para isso.
Homossexuais são pessoas normais, possuem seus desejos e atrações. Podem ser correspondidos ou não, como qualquer heterossexual. Uma cantada deles/delas não deveria ser considerada uma ofensa, porque é uma manifestação de carinho e desejo comum a qualquer ser humano.
Sempre desafio a lenda urbana de que o meio universitário é dominado por homossexuais. Pergunto aos meus alunos assim:
"Por que vocês encontram mais homossexuais aqui na universidade do que fora dela?"
A resposta mais comum é "leitura demais deixa homens e mulheres loucos".
A resposta correta: "pessoas com educação são mais tolerantes. Por isso educação e cidadania andam juntas!"
Grandes centros urbanos são locais onde há educação do maternal ao doutorado (hoje inclui-se até pós-doutorado). Quanto maior o grau de educação de boa qualidade, mais as pessoas se tornam cidadãs, no mínimo passam a saber seus limites e respeitar os direitos das outras pessoas.
As escolas e universidades humanificam o macaco que somos!!!
Pelo menos deveriam ter esse papel.
Todos nós heterossexuais temos pelo menos uma história de discriminação a homossexuais para contar. Todavia, pegamo-nos muitas vezes como o advogado Joe Miller (Denzel Washington) no filme Filadelfia, sempre nos explicando porque respeitamos eles/elas, que até somos "amigos"... mas não somos "gays". Esse final exprime o medo que sentimos de sofrermos o que eles/elas sofrem, sermos discrimados tanto quanto, de viver sem direitos civis, em solidão e até enfrentar a lei de estados e toda a sorte de religiões de amor, paz e inúmeros infernos para os hereges e pagãos homossexuais. Todos humanos demasiado humanos.
As fotos abaixo são de jovens iranianos homossexuais, assim como as mulheres adúlteras, eles são mortos publicamente, mas ao invés de apedrejamento aplica-se o enforcamento.
Há alguns anos atrás meu pai me apresentou ao irmão dele que eu não conhecia. Aos 28 anos de idade conheci um tio meu e nada demais. Após a morte dele, minha mãe me contou em tom de curiosidade, ele era homossexual. Tinha se separado da esposa e teve casos com garotos até sua morte. Não o conheci direito, só troquei algumas palavras e atendi ele com um alô ao telefone algumas vezes, mas sei muito bem que se escrevesse o seu nome aqui a família dele me atacaria, ou mesmo me processaria por isso. Sabem, eu não gostaria de conhecer primos meus dessa forma, ou trazer problemas para minha mãe. Escrevo isso apenas para vocês entenderem muito bem este post.
Minha esposa também possui dois tios homossexuais, vi um deles no enterro de meu sogro. Chorava muito pela morte do irmão, assim como ele, dizia aos soluços que também era diabético e estar muito enfermo. Meu sogro há anos havia cortado ligações familiares com ele e nem queria ouvir falar do nome de seu irmão homossexual.
Da mesma forma que essas pessoas não podem ter nomes aqui, em minha infância conheci dois irmãos "anônimos" que jogavam bola conosco. Um deles era afeminado, por causa de sua fragilidade, arrancava gargalhadas da molecada e era espancado pelo irmão na frente de todos. Este último morreu em um acidente de carro, o pai declarou em público que havia morrido com ele. O irmão sobrevivente anos depois deixou sua casa para assumir sua homossexualidade, lembro dele no ônibus na hora do almoço com sua bolsa preta. Estava meio alcoolizado e chorava um pouco. Eu não sei o motivo, talvez por causa de meu visual da época - "maluco beleza do metal" - , mas ele desabafou um pouco comigo. Foi a última vez que eu o vi em minha vida.
No jogo de bola ele era um péssimo goleiro homossexual, eu era o pior zagueiro heterossexual, mas nunca me espancaram por errar um chute a gol, como o irmão dele fez.
Eu nasci assim, heterossexual, quando mulheres se aproximam de mim eu sinto atração. É genético e fisiológico, um sentimento similar a fome e a sede, porque reprodução também é sobrevivência. Eu tenho esse desejo, identifico as mulheres como lindas e gostosas. Às vezes fui correspondido e é muito bom namorar e transar com elas. Sair para o cinema, andar de mãos dadas em praça pública... coisas que chamamos normais.
Há indivíduos homossexuais entre nós do mesmo jeito, com seus desejos e sonhos. Mesmo se não conhecêssemos as bases genéticas e do desenvolvimento embrionário, teríamos que suspeitar da força natural por trás disso. Ninguém escolheria uma vida de discriminação e solidão social. Pais não desejam isso para seus filhos e, claro, não ensinam ninguém a ser homossexual, como também não fazem com heterossexuais.
Se você nasceu negro, sabe do que estou escrevendo. Não foi escolha sua, da mesma forma que você não pode mudar a natureza física da cor de sua pele. O mesmo está para os homossexuais.
Por fim, segue o vídeo da campanha internacional contra a homofobia (seria melhor chamarmos de humanofobia), peguei a versão em português para não deixar ninguém sem "entender" do que se trata:
Eu discrimino, tu discriminas, ele discrimina... Nós somos todos discriminados! Senão por sermos homossexuais, mas por sermos nordestinos, pardos, pobres, brasileiros, do interior, dos subúrbios... das cores, da língua, da música que ouvimos, da espécie que pertencemos... as faces da xenofobia e de todo o ódio catabólico noscivo.
Obs.1: Veja a bibliografia citada na parte de Referências deste Blog.
Obs.2: Nos comentários, postei o link de um artigo recente sobre genética e homossexualismo enviado por Leon Marrocos, mas ele não aparece completo. Click no link abaixo:
http://journals.royalsociety.org/content/rdd98tj9a5bk1xla/fulltext.pdf
4 comentários:
Leon Marrocos escreveu:
Olá, parabéns por seu blog, tem sido uma leitura inspiradora.
Sou biólogo formado este ano e Mestrando em Biologia Celular e Molecular pela Universidade Estadual de Maringá.
Sobre seu ultimo post sobre a discriminação de homossexuais, em 2004 a pesquisadora italiana Andrea Camperio-Ciani resolveu o problema do paradoxo darwiniano da homossexualidade. Ela correlacionou significativamente a taxa de homossexuais em uma familia com uma alta fecundidade feminina nesta ou seja, o gene (lato sensu), responsável pela homossexualidade masculina confere as mulheres uma maior fecundidade, oque compensa a "castração" do macho e favorece a manutenção deste gene na população a uma taxa de pouco menos de 10%. Ainda este mesmo mecanismo antecede nossa espécie, serviria para explicar a homossexualidade em outros grupos.
Segue o artigo publicado em outubro de 2004 na Proceedings Of The Royal Society B (Biological Sciences).
http://journals.royalsociety.org/content/rdd98tj9a5bk1xla/fulltext.pdf
Olá Leon,
Agradeço demais pelos elogios e espero que sua inspiração seja positiva em trablhos futuros. Deu para notar que gostaria muito de ter feito mestrado e doutorado em Etologia, mas a vida é formada de eventos estocásticos quase fora de nosso controle.
Também agradeço pela informação que não possuia, vou colocá-la nos comentários do Blog. Robin Baker (1997) levantou a hipótese de que os genes homossexuais masculinos e femininos eram transmitidos pelas mulheres e bissexuais. Estes, segundo alguns dados de Baker (1997), teriam um sucesso global em termos de filhos equivalentes, ou superior aos heterossexuais.
Camperio-Ciani (2004) tem uma explicação melhor e coerente com Baker (1997), na qual as mulheres são quem transmitem os genes do homossexualismo.
Olha, escrevo isso com maior tranqüilidade, mesmo sabendo que amigos meus detestam quando falo assim. Tenho os defeitos de um humano comum, sou extremante comum, com uma história ordinária, como canta a banda In Flames (1998).
Na verdade, penso em escrever uma história de ficção ambientada na realidade da sociobiologia. Os posts que faço servem para mim como um longo prefácio, até que eu me sinta satisfeito e começar a escrever.
Bem, é isso! Sucesso em sua dissertação e logo mais, tese de doutorado!!!
Vamos continuar mantendo contato.
Um grande abraço,
Waltécio
Pesquisa recente indica que 99% dos brasileiros tem preconceito contra homessexuais, leiam:
http://oglobo.globo.com/pais/mat/2009/02/07/pesquisa-mostra-que-99-dos-brasileiros-tem-preconceito-contra-homossexuais-754312558.asp
Muito boa a matéria.
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